quinta-feira, 24 de março de 2011

Branca de Neve (III)



À medida que o inverno se vai afastando no calendário, o corpo começa a pedir menos peso para se aquecer.

Aparentemente este fim-de-semana fez cair o pano sobre o rigor climático na zona inferior da escala de mercúrio.

Domingo e Segunda estive no Porto a trabalhar. Mas da janela do meu quarto de hotel, na baixa da invicta, dediquei dez minutos do meu tempo a contemplar o movimento do fim de tarde, enquanto a luz em tons de terra se ia colando aos edifícios que descem até ao Douro.

Cá em baixo, alaranjada pelo calor da réstia de luz horizontal, reparo numa Super trezentos branca. Podia ser a minha. Apercebo-me então que sinto já longínqua a ida à gélida Serra, de onde me cheira a cinzas, já não a brasas. Sabe-me bem, por isso, voltar ao álbum da neve para decretar o fim do inverno.





















quinta-feira, 10 de março de 2011

Interrogações da Arte

Fotografia de Jurgen Rosner


Da autoria de Stefan Rohrer, esta peça está actualmente exposta na Feira Internacional de Arte de Karlsruhe. A localização da Feira pode parecer uma provocação, pois trata-se do berço da arqui-rival Heinkel. Detenho-me, porém, no significado da peça, sem que nada tenha lido sobre o que dela disse o seu autor.

Aparentemente pode sugerir um caracol, mas talvez a ideia de espiral também se adeque. Se assim for, a espiral empurra-me para a ideia de velocidade, por oposição à lentidão do caracol. 

Ou talvez para a ideia de círculo, de pretensão do movimento perpétuo, em si mesmo perfeito. 

Ou de eterna viagem. A Vespa em si mesma uma viagem, ou como instrumento da viagem. Onde o fluxo partida-chegada se confunde no e com o próprio círculo. Que não é perfeito, pois como sabemos... a Vespa tem os seus defeitos. 

Ou...

segunda-feira, 7 de março de 2011

Branca de Neve (II)




O projecto era o de empreender uma viagem de quase trezentos quilómetros em scooter, numa gélida noite de inverno. A solo. Ao encontro de uma serra cuja estrada de acesso poderia estar coberta de um manto branco de neve: é o Vespa Clube de Lisboa na Serra da Estrela!

A previsão meteorológica era de forte nevão a partir das dez da noite de sexta-feira. Fazendo fé nos sites de meteorologia, teria que sair de casa pelas sete e meia, sob pena de ser obrigado a improvisar uma solução de recurso para pernoitar na Covilhã.

Sucede que só rodei a chave de contacto na garagem pelas oito e meia. O que implicou fazer figas para que a Helix suportasse trezentos quilómetros a fundo. E acreditar que os flocos de neve não se abateriam sobre a serra antes das onze da noite.

Passando pela Gardunha, uma estranha chuva que teimava em não escorrer pelo ecrã distraía-me. Mas ajudava-me a esmagar os últimos quilómetros até à Covilhã. Aqui, no sopé da Serra, e enquanto esperava o verde num semáforo, percebi que já não escaparia a uma subida difícil. Começava a nevar na Covilhã.

A minha preocupação era subir em segurança, mas em bom ritmo, tentando apanhar a estrada ainda aberta. Passei pela placa que indica o status das estradas, junto ao início da rampa que conheço bem, pois faço-a a pé com frequência aquando da Rampa Internacional Serra da Estrela. Nada como conhecer um caminho a pé! Esta leitura do terreno permitia-me antecipar o trajecto no meio do nevoeiro e da neve cortada, com flocos cada vez mais numerosos. Ajudava-me o tracejado central e a linha lateral, mas apenas quando as via...

Junto ao Sanatório passou por mim uma alma. Conduzia o limpa-neve e descia demasiado embalado para a minha percepção das condições da estrada. Desviei-me o mais que pude, ele passou pelo meio de faíscas emanadas pela pá de limpeza, enquanto eu procurava manter-me direito e em cima dos trilhos onde ainda tinha alguma tracção.

Fui descobrindo que abaixo dos 30-35kms/h não conseguia ter um nível de aderência mínimo, nem equilibrar-me devidamente, pelo que me esforcei por manter esta cadência regular. Cheguei finalmente à Pousada nas Penhas da Saúde, sem tombar a Helix, o que encarei como uma bem sucedida  primeira experiência na neve.

Estacionei no parque exterior junto à Heinkel do Rui, já esbranquiçada em cima do atrelado. A imagem da Heinkel em cima de duas rodas que não as suas foi a metáfora perfeita do fim de semana. Retida sem pisar alcatrão, amarrada pelos esticadores ao atrelado. Assim estivemos nós, presos à pequena urbe das Penhas da Saúde, com a estrada intransitável até à manhã de domingo.

A conversa ficou em dia, conhecemos novas caras e revimos velhos amigos. A gastronomia e a beleza natural do manto branco cobrindo a Serra reconfortaram-nos. Mas a neve e o gelo calaram-nos os motores. Menos estrada: mais fotos. 



































sábado, 26 de fevereiro de 2011

Três Cenários







Em menos de quinze minutos fiz hoje estas três imagens da Bianca. Sugerem-me três atmosferas: a primeira remete para um clássico cenário industrial, a terceira para uma ambiência campestre. E a segunda ? Guerra civil ? 


Branca de Neve



Dentro de dias, o Vespa Clube de Lisboa dá o pontapé de saída para 2011 na já tradicional ida à Serra da Estrela. A neve e o frio prometem atrair para o cume os pequenos e asfixiados motores, dominados pela altitude. A partir da manhã de sexta-feira e ao longo de todo o dia, irão convergir para aquela cadeia montanhosa quase cinco dezenas de scooters para desafiar curvas e mecânicas. No meio das Vespa, desta vez estará uma Helix. Até lá, apreciem o cartaz do VCL, da autoria do Nuno Saraiva. Boa viagem a todos!



A minha antiga Granturismo, na Serra da Estrela, em Janeiro de 2010.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Regularidade: Um Formato a Resgatar ?



Na sequência de um par de  vídeos mais recentemente publicados no youtube, de que a Horta fez eco, voltei a colocar-me uma questão que já estava empoeirada: quais as razões que explicam a ausência de uma prova de regularidade em Vespa num calendário recheado de encontros, quase todos iguais?



(vídeo Vespa Club Stockolm)


A resposta pode parecer óbvia: dá trabalho. Suspeito, porém, que não pode ser só por esse motivo tão prosaico. Em Portugal organizam-se inúmeros eventos Vespísticos, e ainda em 2010 recebemos o Vespa World Days. Espalhados pelo país encontram-se dezenas de clubes dedicados à paixão pela marca. E não é raro ocorrer sobreposição de datas no calendário.

Em 2007 e 2008 o Vespa Clube de Guimarães organizou uma prova de regularidade, o Guimarães-Lisboa, arquivo de onde retirei a curta selecção de fotos deste post.












Na verdade, não era uma prova de regularidade em sentido próprio, com vários controlos horários de partida e chegada, ou provas de perícia. Era um passeio, bastante agradável, mas não mais do que isso. Numa regularidade vamos sempre com um olho na estrada e outro no relógio, como naquele tempo espelhado no vídeo. Ou como hoje, nos modernos ralis de regularidade para veículos históricos, em estrada aberta.

Posso estar enganado, mas pelo menos os entusiastas com quem tenho mais contacto apreciam as boas oportunidades de fazer girar a sério os odómetros das suas scooters. Custa-me acreditar que quem veja imagens como as do vídeo e, simultaneamente, retire satisfação do acto de viajar em scooter, não se sinta tentado por este formato.

Se a esse gosto pela estrada juntarmos alguma (mas saudável) competitividade, atracção pelo endurance, um road-book a sério, e uma relação pouco conflituosa com as contas às médias horárias a cumprir, temos todos os ingredientes para fazer renascer este tipo de provas. E viver a realidade em cima do banco da scooter. Convenhamos, bem melhor do que ver o canal memória no youtube.


terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Railroad Crossing (III)



Um cruzamento com carris de ferro é um território que raramente resisto a explorar. Prefiro espaços amplos, com pouco ou nenhum casario, em que a presença humana se note apenas na construção da linha e em actividades pouco intrusivas da paisagem. Não raras vezes é o que sucede com as intervenções agrícolas, que não modificam estruturalmente o espaço em seu redor. Importam novas paletas de cor, em função das estações do ano e dos respectivos cultivos, e estão mais próximas do território natural em bruto. Em regra, integram-se na paisagem sem que o meu sentido de observação mais severo as reprove.



A intervenção de ruptura também tem os seus atractivos, como é exemplo clássico o dos espaços industriais abandonados que cercam algumas estações de caminhos de ferro, também elas decadentes. Eram edifícios que davam e recebiam das estações. Não só bens, mas também gente e emoções.

É um pouco de tudo o que se procura quando se deambula numa scooter por estradas  e caminhos estreitos, frequentemente com pouco mais do que a  largura que ocupam dois carris. Por vezes encontro razões para me deslumbrar, muitas outras nem por isso.

Este sábado, depois de alguma pesquisa anterior no google maps a seleccionar uma pequena região que me pareceu ter interesse, lancei-me na estrada. Com terra e muita lama, entrecortada por barrotes de madeira pintados com duas linhas amarelas.