quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Terapia ao Sol em Vermelho e Preto (II)






É curioso como o digital quase esmagou a expectativa que se seguia a uma sessão de fotografia em película. Até à revelação nunca se sabia exactamente com o que se contava. Podíamos ter um resultado melhor ou pior. Mas ele sempre foi medido em função da nossa própria expectativa, o que dava espaço para efabulações e conjecturas, e por vezes algum drama, em especial quando algo de errado acontecia à película.

Recordo-me sempre dos avisos nos contratos de depósito e revelação das películas, que diziam que se, por qualquer motivo, incluindo culpa do revelador, a película entregue fosse insuscetível de gerar fotografias, o laboratório apenas se obrigava a entregar um rolo igual. Felizmente nunca tive que discutir esta cláusula.
 
Seja como for, essa ansiedade própria do espaço de tempo entre o acto de fotografar e o acto de visualizar o resultado em papel, quase desapareceu com a omnipresença do digital. Ainda tenho num saco de material que já não uso um rolo de 1999 não revelado, que não sei como estará se o revelar hoje.
 
No digital, e por mais funcionalidades que a câmera que utilizamos tenha, ainda há um pequeno espaço para esse quase romantismo da espera. Mas alterado. É que nada substitui o impacto da visualização da imagem que criámos num suporte de dimensões generosas. E isso é impossível de conseguir no visor de uma reflex digital. Se quisermos  podemos ver um detalhe, ampliando. Mas perdemos a noção de conjunto, a definição de cor, até o enquadramento em proporções mínimas. Só temos o suficiente para poder dizer que não parece mal. Mas não há garantia de que esteja bem. E, nesse sentido, é uma parte da incerteza que existia na película.
        
No passado fim de semana  senti um pouco isso com as imagens em relação às quais tinha mais expectativa. O plano das duas  LML a subir a  rampa na praia da Calada tinha várias possibilidades. Imaginei logo quatro ou cinco tomadas de vista que permitiam jogar com os desníveis, as texturas do fundo, com o mar e a escarpa abrupta da serra, a luz muito tensa, com um efeito de quase nevoeiro. Tinha uma expectativa alta e confesso que gostei do resultado das duas primeiras imagens que aqui partilho, bem como da fotografia de abertura do post anterior a este.
 





 
 




segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Terapia ao Sol em Vermelho e Preto






Ver gente na praia a tomar banho de mar em Novembro não é habitual. Pelo menos por aqui. Porém, a conjugação de temperaturas amenas com um sol radioso de Outono trouxe-nos uma janela para a fotossíntese.

Em vez de praia, preferi aproveitar para combinar um passeio de scooter. De repente, uma manhã disponível para gozar a Bala implicava apenas sacrificar sono, o que já me parecia uma oportunidade a não desperdiçar. 

Só a possibilidade de começar a descontar algum lazer na conta corrente de trabalho acumulado já me fazia sorrir. Céu azul e abrandar foram expressões que raramente casei na minha realidade quotidiana dos últimos dois meses, o que fez delas urgências para restabelecer algum equilíbrio.  









Depois de uma troca rápida de e-mails, a Bala teve a companhia de uma outra LML 200, a do Paulo Castanheira. Depois de um Lés a Lés e quase cinco meses enclausurada numa arrecadação debaixo de livros e outros pertences do Paulo, a LML vermelha viu a luz a caminho da Oldscooter para uma rápida intervenção de rotina.

Um dia depois estava em Mafra, local de encontro e partida para um passeio sem rota definida, mas que acabou por não andar longe dos cem quilómetros. Apetecia andar de moto. Esta zona Oeste tem esta particularidade: num raio de cinquenta quilómetros, e conhecendo (ou descobrindo) os sítios certos, temos tudo a passar-nos à frente do ecrã : mar, serra, mundo rural e  estradas suficientemente curvas.

As fotografias mostram apenas uma parte do que pode ver-se num passeio de umas horas por estes cenários.

Sobre a comparação de uma LML 200 com uma LML 221, vão ter que esperar por um próximo post.











domingo, 1 de novembro de 2015

A Bala






...E a nova scooter é... (som dos tambores)... outra LML ! (som de palmas e algumas vaias)...

O mecanismo de decisão de compra foi contrário ao que utilizei quando fiquei com a 150 verde. Para a Azeitona resguardei a possibilidade de rapidamente me arrepender e mantive durante uns meses largos a Honda CN em paralelo, até me sentir preparado para essa libertação de uma japonesa quase perfeita.

Com esta LML foi diferente. Apareceu no meu radar via Duarte há um pouco mais de um par de meses, e encaixava na perfeição no que pretendia. Uma LML quase nova, com o motor que queria, o 200, e com mais algumas vitaminas adicionais para escalar andamento com as Lambretta e as Vespa mais espevitadas dos meus companheiros de Lés a Lés. 






Havia apenas que confirmar que as anfetaminas não afectavam de forma muito desproporcional o consumo e, muito em especial, sem tornar a autonomia ridícula. Os testes que o Duarte foi fazendo no final do Verão garantiram resultados dentro das previsões nesse capítulo, pelo que avançámos.

Em cerca de quinze dias vendi a 150, já com esta 200 segura no meu futuro portefólio. 














E o que é que esta máquina tem de diferente ? Em primeiro lugar está realmente nova, sem ferrugens nem toques, que eram abundantes na 150. E depois tem um motor bastante diferente. Com uma capacidade para scooter touring significativamente maior, sem perder uma grama do que de bom tem este desenho.

Acresce que dentro do 200 encontramos um Polini 221, com o também italiano carburador azul certo, carreto e, por fim, o escape Giannelli. Tudo material de primeira, numa scooter praticamente em rodagem. Veio parar às minhas mãos com dois mil quilómetros feitos desde que saiu do stand.

Ontem fez a viagem da Póvoa do Varzim para casa, cerca de trezentos e cinquenta quilómetros, sem pressas. Tirei os maus Dunlop que trazia de origem e escolhi outros, da mesma marca, mas bons: os Scootsmart. O Mestre Ribeiro fez a troca e entregou-ma já calçada de fresco. Entretanto já o Hugo Reis tinha ido buscar-me ao comboio em Gaia. A viagem até à Póvoa deu para pôr alguma da conversa em dia, depois do sono leve proporcionado pela nossa ferrovia no comboio desde Lisboa. Foi neste contexto de dia exclusivamente dedicado ao bom lazer, com um céu negro com algumas abertas mais a sul, que fiz os primeiros quilómetros desta nova aventura. A minha sexta scooter. 

É preta, banco creme, jantes pretas. A minha filha já a baptizou: parece uma Bala. 

Segurem-se.






quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Bons Hábitos







Volto a publicar aqui um post quase um mês depois de ter vendido a Azeitona, a LML 150 verde. A disponibilidade de tempo tem sido tanta que ainda não fui buscar a minha nova scooter.

Tudo isto significa que estive quase quatro semanas inteiras enterrado em trabalho, sem tirar da garagem a Bianca, excepto para dar alguma carga à bateria. Tréguas de não mais de uma hora. Na prática, estive sem andar de moto e com uma nova scooter comprada... há um mês. 

A nova máquina permanece à minha espera no norte do país. Sábado é o dia. Para evitar mais atrasos e afastar mentalmente eventuais novos compromissos profissionais, acabo de comprar o bilhete na CP. Conto que seja o carimbo que faltava para pôr termo à espera.

A madrugadora viagem de comboio lembra-me subida idêntica que fiz em 2006 para ir comprar a minha Vespa Granturismo 200. Também no Outono. Esta será a terceira scooter que compro na zona do Porto. Os bons hábitos são para repetir.   






sábado, 3 de outubro de 2015

LML em Catorze Meses






Catorze meses exactos foi o tempo que a minha LML 150 4T habitou a minha garagem. Como experiência de scooter de origem indiana correspondeu às expectativas. Em certo sentido, até as superou. Acima de tudo, a imagem que fica é a de uma scooter honesta. Tanto mais honesta quanto mais os seus proprietários se convencerem de que não é uma cópia. 


Compará-la à Vespa PX é normal. Dizer que é uma cópia parece-me errado. É uma scooter com uma identidade e características próprias, especialmente estas LML de motor a quatro tempos. Alguns componentes são exactamente iguais, marca e modelo, como o amortecedor Escort da frente. Outros, são iguais no desenho mas diferentes na qualidade, como os rolamentos da roda dianteira. Outros ainda são totalmente diferentes, como o suave motor a quatro tempos. Comum é o desenho exterior, com muito poucas nuances. E, dísticos e logos à parte, é tão bela como a PX. O que também conta para a experiência. 









É divertida de guiar, totalmente analógica e de sabor anacrónico. Uma espécie de 2CV das scooters. E é também económica de utilizar. Teve ainda qualidade suficiente para superar o desafio maior nas minhas mãos, os perto de dois mil quilómetros em quatro dias do Lés a Lés. Cumpriu e com uma relação entre custo e gozo que, para os factores que eu valorizo, é difícil de bater.


É mais fraca em alguns capítulos do que a Vespa PX. Vários. Mas é mais forte noutros. Embora menos.


Items como a pintura, acabamentos, borrachas, electricidade, montagem e rolamentos são inferiores na LML. Motor quatro tempos, consumo, economia de utilização e - principalmente -  preço estão a favor da indiana. No desenho há um empate, o envelope é igual. A qualidade do papel é que pode ser diferente. Porém, o preço também é diferente. E não é pouco.













Então porquê só catorze meses ?


Em primeiro lugar porque não tenho - nem queria ter - uma ligação demasiado emotiva a esta máquina. Ficar com ela menos tempo do que é habitual na minha garagem é um caminho.


Em segundo lugar porque há outras máquinas que encaixam no perfil do que procuro agora.


Em terceiro lugar porque a brigada dos dois tempos vai voltar a atacar no 18º Portugal de Lés a Lés.  E a Azeitona, com o seu 150cc, iria revelar-se curta para acompanhar o andamento das italianas mais endiabradas. Vitaminá-la não seria economicamente viável.


Em quarto lugar, porque outra scooter se cruzou entretanto no meu caminho.  


Longa vida à Azeitona. 


A corrida ao armamento começou.  




Imagem nº 1 : Júlio Santos
Imagem  nº 6: Rui Tavares

domingo, 20 de setembro de 2015

Lés a Lés 2015 (V)







Vocês vão nisso até Albufeira ?” A expressão de incredulidade dos transmontanos em Sabrosa é mais ou menos idêntica à que ouvimos em Armamar, em Belmonte ou Flor da Rosa. Usar máquinas lentas por definição e antigas por opção é um capricho difícil de racionalizar.


Afinal, o Portugal de Lés a Lés é uma proposta de passeio da Federação Portuguesa de Motociclismo de pelo menos doze horas de condução diárias em cerca de mil quilómetros, distribuídos por três dias, que liga o norte ao sul do país, num concentrado de estradas antigas, paisagens pouco vistas e gentes autênticas que convidam os mais curiosos ao uso de motos de viagem. Uma larga maioria prefere trails alemãs com três letras e uma hélice no depósito.


Porém, esta escolha óbvia e tecnologicamente inatacável esbarra num pequeno detalhe: antes da descoberta dos IP e auto-estradas, uma viagem pelo Portugal perdido de antanho, pelas estradas de asfalto onde mal cabe um tractor, pelos empedrados, pelos caminhos romanos, pelos seixos e ribeiras, pela terra e pelos xistos soltos, não se fazia com motos com ABS, controlo de tracção, cruise control e  malas de alumínio. Portanto, as cerca de 580 equipas que abordaram  a prova na perspectiva da lógica do conforto e modernidade, viram o problema de fora para dentro. Nós preferimos ver de dentro para fora. Adequar as máquinas ao simbolismo e matriz da prova: era duro percorrer o país naquele tempo. As motos avariavam, eram lentas, inseguras, e exigiam mestria e domínio de um alicate e de um martelo. Havia platinados para afinar. Travões que sobreaqueciam. Carburadores que entupiam. E repará-los na estrada com as ferramentas do porta-luvas é uma oportunidade para aprender e conviver na beira da estrada. Sem reboques nem assistência em viagem. Gera incerteza mas também gargalhadas. Apela ao improviso, à imaginação para a solução de problemas e ao espírito solidário. Aproxima as pessoas no que elas podem ter de mais genuíno.


É por essa razão que de há oito anos a esta parte me vejo sempre nos palanques de partida do Portugal de Lés-a-Lés. Sempre em scooter, clássica ou réplica de clássica, mas com todos os defeitos das primeiras. Este ano levava a minha LML , uma prima da italiana Vespa, mas com controlo de qualidade indiano, e voltava a ter ao meu lado o Rui Tavares, numa alemã bem diferente, com mais letras. A Heinkel Tourist 103 A1 comprada nova pelo seu avô em 1960. Uma scooter com uma rara história de permanência familiar, que passou por tudo: primeiro por uma aquisição orgulhosa e cuidadosa, depois por uma utilização intensa e despreocupada do neto adolescente, a que se seguiu o esquecimento do abandono num palheiro. A ressurreição do restauro veio a seguir, e as primeiras homenagens ao avô inscreveram-se sob a forma de participação nos Lés a Lés de 2008 e 2009, ambas a cobrir de glória uma scooter que é muito mais do que uma simples máquina de aço amarela. É quase um membro da família do Rui.


A acompanhar-nos nesta jornada tínhamos, pela primeira vez, uma outra Heinkel Tourist. A 103 A2 de 1965 do Paulo Simões Coelho, um gestor que é adepto de uma visão ecléctica do ser humano, e cita Robert Heinlein para o ilustrar. Porque o Homem deve ser alguém capaz de planear uma invasão, esquartejar um porco, projectar um edifício, escrever um soneto, analisar contas, imobilizar uma fractura, confortar um moribundo, acatar decisões, impor decisões, cooperar, agir sozinho, analisar um novo problema, cozinhar uma refeição saborosa, morrer com dignidade. “A especialização é para insectos”. O Paulo fez a sua parte. Comprou uma Heinkel bamba e na qual não arriscou sequer tentar andar e, sem nunca ter sido engenheiro ou mecânico, lançou-se à tarefa de a reconstruir com recurso à sua capacidade analítica, teimosia, literatura técnica e habilidade mecânica para pôr em prática a ideia de Heinlein: ser capaz de fazer.


A organização atribuiu à nossa equipa, a Scuderia Sereníssima, o número 1. O Paulo Simões Coelho aparecia na equipa 2, com o Miguel Lázaro na SYM 125, e a equipa número 4 com a Vespa PX200 e a LML 200 entregues ao fogoso Duarte Marques e ao estreante Paulo Castanheira. 





A odisseia da preparação das várias scooters para a aventura é um processo que é degustado durante meses e alimenta um impressionante tráfego de e-mails entre amigos. Neste particular, as alemãs são as mais críticas, porque para além das peças fabricadas através do clube Heinkel, não existem peças de substituição novas, e as usadas são difíceis de arranjar. Porém, nunca é certa a fiabilidade quando se viaja nestas condições, sem poupanças, em máquinas com mais de meio século.


Para além do desafio pessoal, e da satisfação interior do cumprimento da tarefa quase romanesca, há uma dimensão traduzida em números, que ajudam a explicar a aura destas clássicas: a velocidade máxima destes engenhos está perto da fronteira dos três dígitos, e o número de cavalos no motor não chega a dois dígitos. É preciso saber aceitar que vamos subir as escarpas do Douro a fundo e ver o velocímetro a marcar 45kms/h. Apesar disso e por causa disso devemos sorrir dentro do capacete.


Esta abordagem implica ajustamentos. Aproveitar tudo o que os pequenos motores têm para dar, parar o mínimo, planear bem os reabastecimentos, e encurtar as visitas culturais a fogachos, de modo a que algum do tempo perdido na estrada, e com eventuais avarias, possa ser compensado, chegando dentro do tempo concedido pela organização.


Claro que o imprevisto é certo quando se viaja assim. Só não sabemos quando chega. Logo no prólogo, primeiro à beira da rampa do palanque, e depois em Provesende, foi necessário rever a alimentação da Heinkel A2. Sempre com a reportagem da RTP por perto. Mais tarde seria a Heinkel A1 a reclamar por atenção, num troço de terra no Alentejo, em que o filtro de ar entupiu, tanto era o pó. Furos foram dois na Vespa PX200, canibalizando a roda de reserva da LML 200.


Para recuperar destas paragens não programadas, aproveitam-se todos os metros de estrada, incluindo, em recta, os vários cones de ar que diminuem o arrasto e nos permitem ganhar, três, quatro, cinco quilómetros hora. Velocidade balística. Num desses cones, a descer, a LML marcava cento e dez quilómetros hora no painel. Quase rezei. Ao chegar ao final da descida, o escape partiu, transformando o seu ruído inicial numa réplica de uma XT600 ilegal.


Vaticinou-se o fim da aventura, mas aqui ninguém desiste. A palavra reboque emergiu no meu cérebro, no de outros aflorou-se a hipótese de soldar o escape em Sousel, a alguns quilómetros de distância. As mãos mais experientes e calejadas do Rui Tavares sentenciaram uma reparação no local. Só precisávamos de arame, mas mais grosso do que o disponível no porta-luvas, para aguentar o peso da curva de escape. Atravessando a estrada alentejana encontrámos uma cerca de arame com a espessura suficiente, que nos cedeu, em estado de necessidade, a matéria-prima para completar a reparação.  


Regressar à estrada e acabar a prova é, assim, a vitória da equipa que não desiste. Que se completa e sedimenta na superação das adversidades próprias de máquinas imperfeitas, com carácter e história, também capazes de vencer colinas, descer trilhos, passar ribeiros. À força de perseverança, algum estoicismo e muita diversão. Porque, no fundo, a máquina que levamos também precisa de nós.





Texto publicado na Revista Topos & Clássicos de Agosto de 2015
Fotos de Paulo Ministro

sábado, 12 de setembro de 2015

Moto ou Scooter ?






Há dias almocei com um amigo há largos anos utilizador diário de scooter, que me apareceu no almoço com uma Triumph Bonneville T100 novinha em folha. Perguntei-lhe pela Piaggio X Evo e disse-me que a tinha entregue na retoma à Triumph. Confesso que ainda não tinha olhado com a devida atenção para a T100, e depois de duas voltas à moto concluí que, aparte a configuração do motor, não está assim tão longe da única moto que, hoje, e nas minhas circunstâncias actuais, consideraria comprar para mim: a Moto Guzzi V7. “Porque é que não compras uma ?”, retorquiu. Fiquei a pensar no assunto e voltei mentalmente a uma questão básica: scooter ou moto ?

Classicamente há três grandes critérios de escolha. Nem todos eles com o mesmo peso e importância, uns são decisivos ou eliminatórios, outros não. Em qualquer deles a escolha pode derrapar na escala do totalmente racional e adequado, ao totalmente irracional e desadequado.  




Em primeiro lugar a forma. Nesta categoria podemos incluir o desenho, as proporções, o tamanho.

Em segundo lugar a função. Neste capítulo afere-se o comportamento em geral,  velocidade, travagem, equilíbrio, segurança, ergonomia, altura ao solo, dimensões das rodas. E também aspectos como a manutenção.

Em terceiro lugar o ego. Uma espécie de feel good factor. Um requisito que, consciente ou inconscientemente nos impomos, que pode ser aparente ou evidente, e que avaliamos como necessário para nos sentirmos bem ao adquirir determinado objecto. Quer seja por satisfação interior, quer seja por assumirmos determinada percepção (verdadeira ou não) por parte de terceiros relativamente à nossa escolha.

Na maior parte dos casos, o critério ego é o que decide. Dito de outra forma, o primeiro e o segundo critérios podem estar preenchidos, mas se o ego não quiser, a compra não se fará. Estou convencido que só assim não será se a compra for definida por critérios quase exclusivamente racionais. O que acontece com alguma frequência com motos ou scooters utilitárias. Mas quanto mais irracional for a compra, maior o peso do ego na definição.

No  meu caso específico, nenhuma das minhas scooters é utilitária, de uso diário.

A compra da Bianca foi definida em grande parte por critérios não racionais. E a LML, embora menos, também. Ajuda não lhes dar um uso diário, o que secundariza a razão em função de factores mais lúdicos, ou do domínio do capricho, ou de ordem sentimental. Porém, em rigor este argumento que serve para a escolha da scooter era perfeitamente reversível: podia comprar uma moto como a Guzzi V7. Não me sairia muito mais caro. Teria mais performance, embora sem excessos, é de uma beleza desconcertante, um V2 transversal, uma moto mais competente para longas tiradas como gosto, com outra polivalência.





Alguns dirão que a V7 até conta com uma imagem mais afirmativa. Masculina. E que uma scooter é e sempre será uma moto fraquinha. Leve, lenta, confinada a percursos curtos, para ir ao café ou para o trabalho. Incapaz de entusiasmar. Não é uma moto a sério.

Discordo.

Adoro motos. Mas, para mim, a scooter é um bicho que representa um equilíbrio. Pode ser irracional, metafísico até: a síntese entre uma bicicleta, um pássaro e uma moto.