quinta-feira, 23 de abril de 2009

Litro ou... Watt?


Parece hoje evidente que a energia e o modo como a gerimos é um dos paradigmas em acelerada mutação nas sociedades contemporâneas. Para essa pressão evolucionista muito tem contribuído a convergência de vários factores, não só o emergir de uma crescente consciência ecológica nas culturas ocidentais, mas também, e principalmente, o estrangulamento da economia global e a assustadora instabilidade dos preços do petróleo, que tem obrigado a indústria a pelo menos um de dois movimentos: antecipação e/ou reacção.

Há dias experimentei um veículo automóvel híbrido. Enquanto guiava o novo Honda Insight tive oportunidade de constatar que é no ambiente urbano que estas soluções de energia potenciam claramente as suas vantagens, ao privilegiar a utilização da motorização eléctrica, reduzindo de forma drástica o consumo de combustível se compararmos com um automóvel não híbrido de porte semelhante. Pelo preço pela primeira vez concorrencial, pela qualidade, competência e sentido prático, confesso que olhei para o estranho Insight como o primeiro híbrido com verdadeiro potencial comercial abrangente.

Ao fechar a porta do carro pensava no que a indústria das scooters tem produzido para enfrentar estes novos desafios energéticos.


De imediato me recordei da Vectrix, projecto visionário norte americano de enorme qualidade e mérito, mas cujo preço pouco competitivo e limitação autonómica, resultante da motorização exclusivamente eléctrica, têm impedido de atingir o sucesso comercial que merecia. Lembro-me de a ter visto pela primeira vez no Porto em 2005, no Grande Prémio Histórico da Boavista. Na altura retive a impressão de que era máquina demasiado avant garde para a consciência e o bolso do consumidor real. Conduzi uma em 2007, já com importador em Portugal, e mantive a mesma opinião.


Outras soluções exclusivamente eléctricas têm obtido uma aceitação muito marginal, apresentando várias insuficiências, especialmente as relacionadas com a autonomia, elevado preço de aquisição e a necessidade de carregamento das baterias.


Entre os construtores mainstream o caminho das scooters híbridas tem sido trilhado a solo pela tentacular Piaggio, com as suas HyS (protótipos Vespa LX50 e X8125 e MP3). O protótipo da MP3 HyS foi apresentado em meados de 2007 e tem vindo a ser desenvolvida desde então. As vantagens da solução híbrida quando aplicadas a uma scooter parecem claras e fáceis de entender: o motor eléctrico tem uma disponibilidade de torque máximo desde parado, sem embraiagens nem relações de caixa a atrapalhar, bem como a capacidade de rolar com emissões zero nas bandas de velocidade mais baixas. O terreno natural de uma scooter. Conjugar estas valias com um avançado motor de combustão, auxiliando-o no arranque ou substituindo-o a baixa velocidade no trânsito até parece uma ideia elementar. Se pudermos escolher entre fazer a gestão nos comandos manualmente ou deixar essa tarefa à electrónica, também me soa tentador. E enquanto viajamos em velocidade de cruzeiro ? Carrega a bateria. E se travarmos? Carrega a bateria. Lavoisier está vivo!


Com tantas vantagens, é lícito perguntar porque motivo a Piaggio ainda não lançou a MP3 HyS. Bom, aparentemente é preciso fazer algo simples, traduzir a teoria em prática. Tornar a tecnologia fiável, apelativa ao bolso e subconsciente (leia-se, prazer) do consumidor. O que, convenhamos, não deve ser assim tão fácil, a julgar pelos atrasos que o programa tem sofrido. A última agenda aponta para a entrada no mercado italiano e espanhol da MP3 HyS para o final de 2009, a um preço estimado de cerca de Eur.10.000.


Se compararmos os progressos e recente competitividade da indústria automóvel neste nicho ecológico, parece ainda muito caro e menos significativo em termos de redução de custos e benefício para o ambiente. Mesmo assim, a Piaggio arrisca dizer que a MP3 HyS percorrerá 100 quilómetros com 1,5litros de carburante, o que deve ser entendido como um convite à greve às bombas. Esperemos então que o projecto não fique na gaveta e possa provar o que vale no mundo real.


Certo é que, híbrido ou não, o futuro das scooters está em marcha, embora não se dê muito por isso. A propósito, cuidado com as scooters eléctricas nas passadeiras.

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