No meu pequeno mundo, o espaço das scooters é frequentemente um campo de irracionalidade. Não uma irracionalidade dramática, no sentido económico ou despesista. Mas no sentido de agir ao contrário do que a pura lógica imporia. Há vários exemplos deste comportamento no meu curriculum scooterista. A começar no número de scooters por referência ao uso que delas faço. E a acabar em exemplos tão prosaicos como ter uma scooter fiável, como a Honda CN, e optar por vendê-la para ficar com uma LML, de duvidosa fiabilidade.
Este tipo de raciocínio é usado como contraponto às decisões diárias, na sua esmagadora maioria racionais. Quer por deformação profissional, quer até por formatação de perfil.
Este tipo de raciocínio é usado como contraponto às decisões diárias, na sua esmagadora maioria racionais. Quer por deformação profissional, quer até por formatação de perfil.
A ideia é que a (boa) irracionalidade é necessária para procurar manter os níveis de sanidade mental nos mínimos olímpicos, num mundo em que se trabalha demais, e em que estamos permanentemente a correr esbaforidos atrás de qualquer coisa, geralmente sem importância, e sem sabermos explicar muito bem porquê.
É por isso que no pequeno grupo de scooteristas que me são mais próximos e alinham regularmente no Lés a Lés, nos referimos frequentemente às nossas acções, enquanto scooteristas, como parecendo vindas de um mundo paralelo, ilógico e irracional, em que cada um de nós ocupa o seu lugar numa espécie de nave dos loucos. Porque não fazer o Lés a Lés de Lambretta, ou de Heinkel, ou de LML, ou de Honda Cub ? Quanto mais difícil e lento, melhor.
O que pode parecer só estúpido e pateta, pode gerar graus elevados de satisfação interior e catalisar doses de humor impensáveis numa participação racional.
É um pouco disto que também procuro no mundo das scooters.
Inicialmente a Honda CN 250 correspondeu a um desejo de participar no Lés a Lés de 2009 com uma scooter diferente das demais, suficientemente excêntrica para equilibrar um pouco as atenções dispensadas à Heinkel Tourist do Rui Tavares que comigo fez equipa.
Era suposto ficar seis meses, mas ficou sete anos. Porquê? Porque é talvez a minha melhor scooter. Cinco Lés a Lés em cima daquelas rodas, sem um único queixume. Sem me pedir nada mais do que a regular manutenção de uma máquina actualmente com 21 anos. Nada se partiu, nada deixou de funcionar, nunca fiquei na estrada. Que scooter ! Suspeito que não vá poder dizer o mesmo da LML. E desconfio que a LML não ficará tanto tempo como ficou a CN...
Simplesmente concluí que três scooters me ocupam demasiado espaço. Na garagem e na carteira. Mas sobretudo espaço mental. Saber que tenho e não uso, ou apenas o faço marginalmente, quase por obrigação, não é uma medida... racional. Neste caso cai na categoria da má irracionalidade.
No momento em que escrevo a CN já está nas mãos de um coleccionador português de motos inglesas. Mais uma excentricidade na sua colecção.
Do meu lado fica a boa memória e um álbum de fotografias. Obrigado, CN.
9 comentários:
Não vou sequer disfarçar. Tenho pena de a ver partir, companheira de muitos Km's por este Portugal fora. Não quero falar mais do assunto.
Gosto de ler o teu Blog, Vasco. Tens uma forma gira de escrever, opinar e até convencer... mas hoje não gostei de ler...
Está muito bem escrito. Os argumentos, o raciocínio, o enquadramento e até as vénias à CN são merecidas... mas não gostei de saber.
Se a CN tivesse um rosto no nosso pequeno universo scooterista lusitano, arrisco-me a dizer que tu era essa cara. Mais do que uma boa dose de quilometros que fizeste nela e LALs, escreveste-a, fotografaste-a e ostentaste-a pelo país, como ninguém. Mostraste a muitos que aquela coisa feia, era digna de tapete vermelho e apaixonaste outros.
O mundo Helixiano está de luto... excepto o novo coleccionador.
Obrigado nós, leitores, por ter partilhado tão boas impressões e belíssimas aventuras com a sua Helix. Lembro-me do aparecimento da CN no mercado nacional e sempre achei uma mota perfeitamente irracional, nao sei se por ser a primeira scooter de cilindrada maior, ou pela sua apresentação tosca e o seu jeito quase disforme. Certo é que ao ler os seus relatos, leva-me a olhar atualmente para as Helix de outra forma, reconhecendo-lhe as devidas qualidades enquanto moto e veículo retemperador. Com a sua paixão por este mundo de duas rodas e tudo o que o envolve, mesmo com a garagem reduzida, tenho a certeza que por via da India ou de Itália virão excelentes posts. Obrigado, Vasco
Infelizmente nunca cheguei a "conhecer pessoalmente" a tua Helix. Mas se hoje desvio o olhar para uma CN250 deve-se a ti, pois foi precisamente neste blog que comecei a olhar para este modelo de outra forma. Foi aqui que, muito antes de te conhecer pessoalmente, percebi o valor que uma Helix tem escondido debaixo daquelas formas rectilineas de nave espacial de series de ficção dos anos 80/90. Foste um excelente embaixador deste modelo. 👏👏👏
A irracionalidade que falas neste post, deve ser algo perigosamente contagioso! LOL
Rui,
As memórias ninguém nos tira. O futuro será com outras scooters, agora a LML, amanhã talvez outras "CN´s"...
Abraço,
Vasco
Miguel,
A semente da CN ficou em vários amigos, tu foste um deles, e ainda bem. A tua CN é um achado que fazes muito bem em guardar e está muito bem entregue. Aliás, tenho curiosidade em voltar a andar nela daqui a uns tempos. Confesso que a par da vontade, também tenho algum receio das sensações desse dia.
Talvez só aí consiga confirmar, em definitivo, que a minha decisão estava bem resolvida no meu espírito.
Abraço,
Vasco
Toni,
Obrigado pelas simpáticas palavras. Essa ideia de ser embaixador de um modelo de scooter é lisonjeira. Posso tentar vendê-la à Honda, quem sabe... :-)
Vasco
Castanheira,
A irracionalidade é contagiosa, tens razão. No teu caso acho que havia uma certa predisposição para aceitares o repto pela LML. Acho que estava lá a vontade, algures no subconsciente. Só não tinhas ainda dado por ela. A minha compra e a nossa troca de impressões, juntamente com a vontade de fazeres o LAL, trataram do resto. Vai ser épico este LAL !
Abraço,
Vasco
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