O mercado de motos nunca foi imune às tendências da moda e design dominantes. Julgo que está até na linha da frente para influenciar esses movimentos. A scooter, como subdivisão dentro das motos, e por ser um veículo especialmente prático, que traduz liberdade individual num sentido ainda mais nítido do que outros separadores nos catálogos de motos, é especialmente sensível à influência neo retro.
O êxito que a Vespa retomou no século XXI vem muito alicerçado nessa perspectiva ligada às referências do passado. Parece fácil no papel, mas a verdade é que a Piaggio manejou esses princípios como ninguém. Fundiu essa tradição em novos produtos através da adição de aspectos pragmáticos, que representam modernidade, mesclados com referências antigas, em especial as estéticas, atribuindo-lhes muitas vezes um sentido coerente e unitário, e não de mera soma de referências.
Muitos tentaram seguir essa tendência oferecendo modelos de scooter de inspiração retro. Mas muito poucos com o impacto e sucesso desejado.
A Peugeot, com uma tradição nas motos tão antiga que já ninguém se lembra, apresentou na EICMA 2013 um modelo de scooter que me impressionou como nenhum outro este ano: a Django.
A escola francesa de scooters teve alguma expressão no passado através de muitos pequenos construtores - Motobecane, Griffon e Terrot - que, porém, nunca lograram atingir escala que lhes permitisse verdadeira expansão. A Peugeot fez parte desse contributo gaulês nos anos 50, através dos modelos S55 e S57. Foi precisamente nestes modelos que a marca francesa se inspirou para criar a Django.
Salvaguardando o impacto que só uma visualização ao vivo pode causar, o design da Django é uma surpresa, e surge com uma frescura difícil de antecipar de um construtor histórico mas que tem dedicado pouca atenção ao fenómeno das scooters.
A carroçaria sublinhada pelo enorme friso lateral cromado e pelas três entradas de ar laterais nos flancos, fazem lembrar os ornamentados carros americanos dos anos 50. Mas também a forma longa da carroçaria remete para algumas scooters viajantes da mesma época, de que são exemplo algumas alemãs com aptidão turística, como as Heinkel Tourist ou a Maicoletta. Esta Django tem um desenho comprido como as alemãs, mas mais gordo, e nesse sentido podem ser encontradas semelhanças com outra francesa, a Terrot VMS2, também ela da década de 50. O impacto aparente deste desenho da Peugeot vai, portanto, em várias direccões e relembrou-me vagamente a revolução que foi a primeira Aprilia Scarabeo maior, uma scooter ainda hoje sedutora.
Voltando à Django, a traseira é personalizável com o segundo banco ou a carroçaria sport, de banco único muito bem resolvido e bagageira de desenho simples. Aliás, este último elemento estilístico é recuperado da S55, embora nesta estivesse montado por cima da roda frontal. O remate atrás está a cargo de um esguio farolim traseiro, e é também exemplar a forma como resolveram o problema dos piscas, dissimulados na linha do friso.
Os detalhes também estão presentes à frente, onde se evidencia um farol de leds com uma linha bem original, sem cair na tentação do barroco. A instrumentação é menos audaz, um misto clássico da inspiração automobilística de meados do século XX, com um grande centro de contornos rectos com a informação em LCD. Os espelhos são distintos e originais.
E a mecânica ? Estão previstos motores pequenos, e esse talvez seja o seu maior pecado. Capacidades de 50, 125 e 150cc representam uma oferta curta, que faz suspirar por motores na gama entre os 200 e 300cc, disponíveis no banco de órgãos das scooters Peugeot. Talvez o volume e porte da scooter tivesse que ser corrigido, mas valeria a pena tentar, porque o desenho é demasiado bom para ficar por aqui.
Seguindo uma tendência do mercado já muito em voga nos automóveis, que apela à personalização quase infindável do produto, a Peugeot propõe 118.000 (!) configurações possíveis, numa tentativa de proporcionar scooters únicas à saída da fábrica. Sinais dos novos milhões de mercados de dúzias de pessoas, que lentamente substituem o paradigma das antigas dúzias de mercados de milhões de pessoas.
Imagens: Peugeot
3 comentários:
Fiquei bastante surpreendido com esta Peugeot. Não sou grande conhecedor do universo e história das scooters, mas parece-me ser uma aproximação retro (bem conseguida)da Peugeot, que não tendo no seu historial modelos marcantes, foi beber a inspiração a outros construtores. Eu vejo um claro distanciamento do mundo Vespa, mas uma aproximação claríssima ao estilo Lambretta.
Não desgostei, antes pelo contrário! Tem um ar muito robusto e como dizes, espero que lhe montem motores de 250 ou 300cc.
Interessante, de facto
A Peugeot s55 sempre foi uma das scooters clássicas que mais me fascinavam esteticamente, esta Django está engraçada não encontro muitas semelhanças com ela, mas gosto...
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